Mudanças na análise futebolística
- Leonardo Pereira
- 24 de jun. de 2019
- 5 min de leitura
O profissional que acompanha de maneira aprofundada o esporte tem crescido exponencialmente

O que no Brasil sempre acompanhamos de maneira lúdica. E que os dirigentes contratavam baseados na aparência. Ou mesmo em poucos jogos. E no qual a torcida reclamava de todos os jogadores e dificilmente conhecia alguma das novas contratações. O futebol, assim como outros esportes, deu o braço a torcer e agora baseia suas decisões em estatísticas e acompanhamento aprofundado. Criando assim uma nova profissão, o analista de desempenho.
A prática é comum em outros esportes, principalmente os americanos. Tanto basquete, beisebol quanto futebol americano se utilizam de dados para analisar e tomar suas decisões. Inclusive vem de um deles o maior exemplo desse uso na história, o time de beisebol Oakland Athletics, franquia pequena da liga americana, a Major League Baseball (MLB), que na década de 80 resolve, após decisão de seu gerente geral Billy Beane, apostar todas suas fichas em jogadores que são escolhidos através de analises aprofundadas de estatísticas. Usando como ajuda o recém-formado em economia Peter Brand para comtemplar tais dados. Acontecimento que ficou eternizado no filme Moneyball (O Homem que Mudou o Jogo, no Brasil) que tem como protagonista Brad Pitt. Quem olhou o longa entende a ligação, é possível considerar Peter Brand um dos primeiros analistas de desempenho da história.

No século XXI, a política de analise está completamente difundida em vários esportes. Inclusive no futebol, do qual teve seu estopim no início dos anos 2000 com José Mourinho e a "escola portuguesa" de treinadores teóricos, que passou a formar profissionais especializados nos processos de análise. A partir do sucesso da parceria Mourinho-Villas Boas no Porto, a figura do analista de desempenho profissional passou a se disseminar pelos clubes, que inauguraram departamentos e passaram a investir em tecnologia. Em sequência vierem outros nomes como o do técnico espanhol Pep Guardiola, reconhecido mundialmente por seus trabalhos fantásticos em Barcelona, Bayern de Munique e Manchester City e considerado um dos melhores técnicos de todos os tempos.
Essa é a realidade europeia, onde a função tem completa ligação com o treinador e é valorizada. No entanto, no Brasil a realidade ainda é bem diferente, no país do futebol a palavra analista de desempenho relacionada a dados e estatísticas assusta dirigentes e certos torcedores mais antigos. Afinal, segundo os mesmos o brasileiro nasce com o dom de jogar bola e não são números frios que irão definir sua qualidade. O analista de desempenho profissional, Eduardo Cecconi, um dos responsáveis pela recuperação ocorrido no Grêmio nos últimos anos, comenta que a realidade no país é bastante heterogênea, ao mesmo tempo em que existem dirigentes amadores que limitam tais profissionais existem casos de equipes que apostam todas suas fichas nesses serviços. “O departamento de análise se torna o que no orçamento familiar seria a tevê a cabo: qualquer dificuldade financeira, corta-se o supérfluo - e para os amadores, o setor de análise é supérfluo. Então é comum vermos clubes grandes, com recursos, negando-se a investir no setor, mantendo profissionais mal remunerados e mal aparelhados. No entanto, há clubes que profissionalizaram o setor com bom número de analistas, respeitando os processos e valorizando o trabalho, e mantendo a atualização tecnológica (Corinthians e Atlético-PR são os melhores exemplos) ”, completa Cecconi.
O que faz o profissional?
As funções do profissional de análise passam desde apresentar informações sobre contratações e chegam a influenciar o estilo de jogos das equipes, como por exemplo ajustando a formação em adequação ao seu atual elenco. Podemos citar como funções a análise de atletas de forma individual, de treinos, de jogos, compra e venda de atletas para clubes e empresários, detecção de talentos e análise dos adversários. “São três pontas que agrupam diversas atividades: afirmação do modelo de jogo, análise do adversário e prospecção de mercado. Sobre a própria equipe são elaborados scouts, relatórios, acompanhamento de treinos, distribuição da informação e qualquer tarefa solicitada pela comissão técnica ou pela direção; do adversário são também elaborados relatórios, analisados scouts e editados vídeos de análise; na prospecção de mercado pode ser feito monitoramento, acompanhamento, análises comparativas, rankings de acordo com perfis pré-determinados”, afirma Cecconi.
O analista de desempenho não precisa ter uma formação especifica, como um matemático, econômico ou jornalista. Apesar que existe um crescimento exponencial na busca pelos dois primeiros citados. Cecconi comenta que os mesmos são responsáveis pela elaboração de indicadores de performance - métricas com potencial preditivo, antecipando tendências da equipe, dos adversários e de alvos de mercado. Dados que são extremamente complicados para obtê-los e também para explica-los, com isso seu papel se faz presente não apenas na sala de reunião com dirigentes como também em conversas com os treinadores. Números que crescem de valor quando o assunto é futebol de base, vide sua pouca visibilidade e difícil acesso às partidas. Além dos tradicionais olheiros, pessoas dedicadas a assistir partidas dos jovens e indicar nomes para a diretoria de clubes, o analista de desempenho adquire essa função na atualidade. Variando de clube a clube, cada departamento pode traçar planos em conjunto com as comissões técnicas para desenvolver protocolos de análise para correção de gestos técnicos e tomadas de decisão, por exemplo, sem tanta preocupação com aspectos coletivos, principalmente até o sub-15. E obviamente sendo essenciais no momento de realizar uma contratação de um atleta que ainda não atuou pelo profissional.

Nos treinamentos é onde entra a hora mais relevante para tal analista. Para analisar e resolver problemas dos jogadores é necessário acompanha-lo fora da mecânica de jogo. Por isso os treinamentos, no qual os analistas são utilizados como auxiliares de campo, ou para captar imagens e dados de scouts. Tendo como função ajudar os treinadores a resolver problemas de difícil resolução. Cecconi foi analista de desempenho do tricolor gaúcho por 5 anos e é considerado por inúmeros especialistas peça essencial na recuperação da equipe que vivia seca de títulos e venceu a Copa do Brasil e Libertadores no período de dois anos, ele cita que o setor de análise produzia conteúdo com alto teor informativo, e o distribuía entre os personagens que tomam as decisões no clube (comissão, jogadores e dirigentes). “Varia entre todos os citados o interesse pelo material que é produzido, mas hoje com as tecnologias de envio rápido de informações (Whatsapp, servidores na nuvem, etc.) é possível driblar pessoas resistentes ao processo e fazer a informação chegar aos jogadores, que cada vez demonstram maior interesse em se estudar e estudar os adversários”, finaliza o analista.
É possível afirmar que o crescimento do analista de desempenho faz parte de uma maior profissionalização do esporte no país e é uma realidade que tende a crescer nos próximos anos. Atualmente é obrigatório um certificado na Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para atuar na profissão e a remuneração varia de clube a clube com relação a valorização que cada um dá ao serviço, em muitos casos os analistas de desempenho abrem sua própria empresa (Eduardo Cecconi tem a Perfomance, por exemplo) que tem como foco auxiliar os clubes de forma terceirizada. Claro, se o foco for se aproximar do nível europeu, visto que nos últimos anos estamos cada vez mais distantes, apenas assistindo aos resultados das seleções (Brasil venceu a Copa do Mundo pela última vez em 2002, de lá para cá apenas europeus vencem) e clubes (não conquistamos o Mundial de Clubes desde o Corinthians em 2012) que verificamos tais disparidades. O analista de desempenho pode ser o início da mudança.
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